Profissões suspeitas
O Dentista é um ser demente. Sim, vim de um há bocado e ainda estou revoltado estupefacto com aquele ser de bata branca e máscara à japonês que consegue ver beleza num escancarar de boca por nela descobrir, por técnicas que permitiriam salvar 33 homens no Chile, o mal de umas dores insignificantes que em determinado siso se resolveram instalar. Quem vê beleza nisto, é demente, insano, louco!
Ainda bem que os há, não me entendam mal, mas a verdade é que só um ser macabro consegue imaginar uma vida bela dedicada ao mundo das cáries e tortuosidades dentárias. Ninguém no seu perfeito juízo sonha em inalar para o resto da vida o mau hálito da velha que lhe abre a boca por dá cá aquela palha, ou em ver a esplendurosidade de uma dentição putrefacta como os campos minados de Angola e ficar contente por pelo menos não ter larvas. E menos ainda poderá alguém, na sua perfeita sanidade, ficar feliz por ver contorcer na sua cadeira ergonómica um corpo de alguém que, ainda que vivo, não consegue gritar por se ter tornado num depósito de brocas, perfuradoras e martelos pneumáticos, e a quem lhe resta apenas gemer para dentro e cravar as unhas roídas na enfermeira que sadicamente lhe vai sorrindo lá do alto.
Isto é um exagero, pois claro. Mas há profissões que me deixam assim: ávido por perceber a beleza que nelas vê quem as segue.