Pela Avenida da Liberdade
Contrariamente ao que muitos tentam fazer passar, a manif contou com um mar de gente quase tão impressionante como o tsunami do Japão. Gente de esquerda que farta da própria esquerda roubou as ruas aos comités e aos berloques e se misturou com gente de direita, de pullover aos ombros, que se borrifou nos conselhos conservadores dos paizinhos e achou que, também para eles, era hora de mudar e assim se juntou a outros que lá estavam, uns de cabeças rapadas e vestidos de preto, outros de rastas com ganzas no bucho, na mona e, para reserva - sobre a orelha; Mais uns com filhos ao colo, outros ao colo dos filhos. Uns de megafone em riste, outros de máquina fotográfica em punho ou de cartolina estridente. Todos descontentes com o actual estado das coisas. A manif foi pacífica, espôntanea e fez história.
Mas, tal como não sabia por que rua seguir depois do Rossio, também foi difícil perceber que rumo queria para o dia seguinte: se por um lado se queixava do presente, destes políticos e das reformas que lhes estavam a propôr, por outro lado recuperou Vitorino ou Fernando Tordo, como símbolos, esses que também foram símbolos da outra revolução e do modelo que nos trouxe até aqui. Também eles enquanto caras de uma revolução teimam em dar o lugar a outros.
Se por um lado se queixava de que as novas ideias e o futuro, não têm espaço em Portugal e que este país não é para jovens, por outro lado recuperava motes anacrónicos do 25 de Abril e reclamava para si conquistas dos papás que não se coadunam com a globalização e a constante mutação dos dias de hoje. Mais um pouco e propor-se-ia a uma nova constituição. Igual à que temos, mas nova, pois claro!
É por ter ido ao baú que esta onda, do tamanho do tsunami do Japão, não foi mais devastadora. Vai deixar mossa, é verdade. Mas apenas neste governo, quando o que se pretendia era que deixasse mossa nas consciências e no Estado.
Eu, por mim, não quero um país socialista, nem socializante. Preciso de uma Avenida da Liberdade num país mais liberal. Falta que os outros definam que Estado querem, para que isto mude de facto.